Minha mãe, Mami, como a chamávamos na intimidade, foi uma mulher extraordinária. Tive o privilégio de conviver por muitos anos com ela, enquanto ainda escrevia estas linhas.
Sempre que saía em viagem, pedia a bênção para ela.
Pedir a bênção é intencionar liberação, autorização para seguir adiante pela vida com a aprovação e anuência dela, a matriarca.
Para acolher um sobrenome de origem alemã, minha mãe — que até os seis anos de idade falava apenas italiano — desdobrou-se, inclusive na culinária, para acalentar o estômago de seu amado e tentar, em vão, receber o reconhecimento do ramo germânico da família. O tradicional repolho roxo cozido com maçãs era um dos pratos preferidos de meu pai.
Mami tinha a intuição aguçada. Ela contou-me que estava em uma praça, certa ocasião, quando passou por ela um homem, ao que ela ouviu uma voz interior dizer: “Este será o seu sogro”. Dias depois, meu pai, o enteado deste que ela avistou, apareceu no seio da família dela.
Também filha de imigrantes, mas italianos, Mami dedicou sua vida à família. Gerou e pariu seus cinco filhos. Aprendeu a dar os cuidados sanitários que ela e seus muitos irmãos e irmãs não receberam.
Lembro de sua dedicação, tricotando blusas, arrematando peças do meu uniforme de educação física na máquina de costura Singer. A comida infinita na mesa, em que as sobras de ontem voltavam em pequenos potes para a refeição de hoje.
Lembro da grande cozinha integrada à sala de jantar e do fogão a lenha, que um dia chegou para ancorar a energia do sol naquela casa. E o fogo da lenha, liberando a energia do sol, fez da cozinha o centro da casa.
Lembro do chinelo corretor de conduta. Afinal, manter a autoridade sobre aquela tropa de filhos exigia algum rigor. Mas nossa agilidade para correr — e o quintal — eram grandes, e sabíamos que, se as coisas esfriassem, sumindo por algumas horas, o rigor da punição fraquejava.
A bênção, minha mãe!
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