Agarrado ao galho mais alto do pinheiro, eu balanço ao movimento do vento, desafiando o medo quando o galho se inclina mais perigosamente.

Ali, eu podia olhar o mundo para fora dos limites do grande quintal que me acolheu, do alto das minhas árvores amadas.

Sempre tive o impulso e a fascinação de ir de encontro ao mundo e suas sensações, mas, ao mesmo tempo, um enorme freio me limitava. 

Desde sempre me percebia deslocado. Uma sensação de não me encaixar nos lugares por onde andei.

Após muito trabalho e pesquisa no assim chamado autoconhecimento, entendo hoje que eu trouxe em minha estrutura operacional de chegada nesta vida um expressivo grau de autismo.

Para os que não conhecem, o autista traz consigo, desde o nascimento, um bloqueio de medo em relação ao mundo. Conforme o grau de intensidade, os autistas transitam entre dificuldades em se relacionar e expressar o que sentem até um bloqueio total em relação ao outro, em que a simples presença de mais alguém no campo de visão resulta em um travamento comportamental e até mesmo em surtos emocionais descontrolados.

No meu caso, o fator autista oscilava em níveis intermediários de intensidade, já que os destemperos comportamentais de que me recordo transitam muito mais pela pouca paciência e pela intolerância, o que não daria para chamar de surto. Contudo, travamentos comportamentais e constrangimentos em situações sociais eram a normalidade em minha primeira infância e persistiram, manifestando-se ainda hoje de formas variadas e em diferentes intensidades.

Seja como for, socializar sempre foi um verbo difícil de conjugar. 

Curioso é que o que eu mais desejava era estar com o outro. Porém, tinha medo, muito medo de permitir a experiência. Medo do outro!

Assim, com essa programação original, vim para o mundo.

E, de fato, devido a essa agenda de origem, procrastinei inúmeros desejos. Medo de ir a festas e até mesmo a encontros familiares. Medo de estar em público. Pavor de falar em público. 

Adiei projetos. Declinei convites. Resisti a impulsos emocionais.

Deixei passar os dias, dedicando-me a atividades seguras para a mente do ego. Atividades corriqueiras, que preenchiam o tempo, mas adiavam os impulsos de viver a vida.

Brincar com meus irmãos, construir os próprios brinquedos na oficina que sempre havia em casa, brincar sozinho. Tudo remetia para um ambiente seguro e longe dos perigos existentes para quem pisasse fora do portão de casa. 

O mundo lá fora era perigoso. É curioso olhar para isso hoje, em tempos pós-pandemia.

Mais ainda: eu era incapaz de entender como eu era percebido pelo outro!  Aspecto particularmente desafiador, pois alimenta ainda mais o meu medo do outro: não sei o que vão pensar de mim, portanto, eu me retraio. 

Eu era incapaz de olhar no espelho e enxergar a mim mesmo. Questão ainda em permanente aprendizado. 

Curiosamente, em flagrante oposição a essa programação autista, cheguei ao mundo com o dom da comunicação. Na numerologia, carrego quatro números três na minha carta natal, gerando um conflito existencial que sempre demanda atenção. 

O travamento emocional de estar com os “desconhecidos” em extremo oposto ao comunicador, aquele que catalisa a atenção desses “desconhecidos”, ou seja, me aproxima deles. Tive de lidar, depurar, respirar muito, ao longo de muitas décadas, para apenas começar a equilibrar essa potente polarização. Aprender a dar vazão a essa habilidade, cujo impacto no outro eu não era capaz de enxergar.

Aqui, abro um parêntese para chamar a atenção para esta maravilhosa orquestração de polarização: o medo do outro cria um freio para o comunicador. Sem este freio, seria muito fácil cair no “lado negro da força”, ou seja, usar as habilidades de comunicação para seduzir, aliciar, manipular o outro para me servir. 

Liderar o processo de ancoramento d’Os Corpos da Alma neste plano físico é um processo para aprender a servir. Na minha percepção, hoje, um processo de permanente aprendizado.